Wednesday, December 26, 2007

Pelos olhos de Ethan

O menino franzino estava parado no meio do quarto espaçoso, enquanto mantinha os olhos fechados, como se estivesse sonhando. Talvez se fizesse isso a sensação de conforto que a cama quente e macia evocava e o doce cheiro de bolo de limão ainda permanecessem ao seu redor por mais algum tempo e ele não precisaria ter que procurar algum abrigo público que oferecesse comida aos necessitados, ou quem sabe revirar algumas latas de lixo pela vizinhança.
Não, ele não tinha mais que fazer isso, ele agora estava com Alex e Logan, e eles o tratavam bem. Queriam que ele fizesse parte da família deles. Recordava os olhares amorosos que eles trocavam entre si e pensava se um dia iria viver aquilo, quando crescesse. Provavelmente não.
Um raio nunca caía no mesmo lugar duas vezes... Já estava bom ter um teto e comida quente... O que viesse, além disso, era lucro.
Alexandra e Logan... Eles o salvaram e talvez nunca se dessem conta disso. - pensou enquanto vestia as roupas quentes que ganhara e deixava para trás no espelho a imagem do menino com machucados na alma.


Surgimos, que dizer, aparatamos perto do portão de entrada e começamos a caminhar para uma casa enorme de pedras cinzentas, quando a porta da frente se abriu e vários homens jovens apareceram e alguns correram para ajudar com a bagagem e outros ficaram na porta esperando. Para Alex devia ser uma coisa normal, mas eu me retraí, pois estava chocado com a aparência deles:
- Eles usam saias...
- Chama-se kilt. – foi o comentário de Logan, e senti que ele também estava tenso.
- Eles são bichas?- perguntei de olhos arregalados olhando para aqueles rapazes usando saias com o mesmo tom de xadrez, parecia um uniforme.
- Não, eles são escoceses. – Alex respondeu quando um garoto alto, de cabelos negros e um enorme sorriso na cara a levantava num abraço:
Logan pareceu entender meu receio e disse baixinho, antes que ele se virasse para nós:
- Também fiquei assustado na minha primeira vez aqui, depois me acostumei filho. Vai dar tudo certo. – e acreditei em cada palavra que Logan disse, me acalmei.
- Oi mãe. Tio Logan... E ai? Você é o Ethan? Bem vindo ao clã. Meu nome é Ty. – o garoto disse sorrindo e esticando a mão.
Embora eu sentisse o receio revirar minhas entranhas, apertei sua mão estendida. Depois ele ajudou com as malas e começou a falar de coisas, e pessoas que eu não conhecia, sobre a escola. Vi quando Alex relaxou os ombros aliviados, e me senti seguro. Segundo Logan, ela era o elo forte da família, que estávamos formando, e eu entendia o que ele queria dizer, ao vê-la feliz no meio de toda aquela gente.


A casa era um lugar enorme, toda decorada com galhos de visgo espalhados, e tinha muitas luzes pequeninas, que quando cheguei perto percebi que eram fadinhas, não iguais à Sininho do Peter Pan, porém diferentes e eu confesso: esquisitas.
Um enorme pinheiro todo enfeitado estava a um lado da sala e embaixo deles, havia muitos pacotes, fechados e o brilho do papel de presente chegava a ofuscar. No lado oposto da sala, estavam dois homens velhos, concentrados numa partida de xadrez. Parei para observar e pulei para trás quando a torre branca, atacou o cavalo negro.
- Uau! – foi só o que consegui dizer.
- Xadrez de bruxo! Igual ao xadrez normal, porém as peças são mais temperamentais. Quero jogar com você, Orwell. Quero uma revanche. - disse Logan amistoso e o mais velho dos dois disse:
- É sempre bom, pôr as mãos no dinheiro dos jovens. O dobro?
- Não esperava menos. - respondeu Logan e os dois riram.
- E o nosso jovem? Também joga?- o velho perguntou.
- Sim, mas ainda é um aprendiz Orwell, conto com seus ensinamentos.
- Será bem vindo, jovem aprendiz. - e sorri de volta.
Continuei a olhar pela sala enorme, e meu olhar foi atraído para a lareira onde com certeza cabia um ser humano de pé, toda enfeitada com meias, e podiam-se ler os nomes nelas, uma menina de cabelos longos, se aproximou e empurrou uma meia na minha mão e falou como se nos conhecêssemos há anos:
- Nossa, como você demorou, venha pôr sua meia na lareira.
- Uma meia? Eu?- fiquei confuso. Sentia meu estômago se mover de jeito esquisito, parecia enjoado, enquanto olhava para ela.
- Claro, Ethan você é um de nós agora, precisa colocar sua meia na lareira, ou o Papai Noel não vai te trazer nada. Venha tem lugar ao lado da minha meia. - apontou e naquela hora soube que seu nome era Brianna e ela era a coisa mais bonita que eu já tinha visto.


O dia de natal amanheceu com uma alta camada de neve do lado de fora. Acordamos com Brian e Brianna entrando no quarto e gritando, seguidas das outras primas:
- Presentes! Acordem! Olhem os presentes.
Levantei-me devagar, quando ela veio me cutucar:
- Vamos Ethan, abra seus presentes.
- Presente? Pra mim?
- Claro, que sim, hoje é Natal, todos ganham presentes.
Olhei para os pés da cama e havia um monte de pacotes, Declan disse:
- Hey, baixinho, os pacotes não se abrem sozinhos... - e vi quando ele abriu uma caixa da sua pilha e jogou um sapo de chocolate na boca e disse olhando a figurinha:
- Valeu Chloe, não tinha esta figurinha na coleção.
Ty se aproximou e disse, ao me ver hesitante:
- Ethan, são seus pode abrir.
- Mas eu nunca ganhei presentes de Natal antes... E se que Papai Noel não existe... - e me arrependi. Todos pararam e ficaram me encarando e senti minhas orelhas queimarem de vergonha. Brian e Brianna olharam espantados para os primos mais velhos:
- Ele não existe? Papai Noel não existe?
- Claro que existe, a prova disso são os presentes, quem traria tantos numa noite só? – disse John e eles relaxaram.
Ty completou:
- Ele existe e te deixou um monte de coisas, além dos nossos presentes. E se não abrir isso logo, mamãe vai achar que não gostou de nada e vai querer devolver. Viu como estava chorona ontem? E não era por causa do eggnogg. – assenti e aproximei-me devagar e peguei um pacote, abri com cuidado, e era um dos robôs do Transformers, todo amarelo. Logo o que ruído que se ouvia no quarto eram de pacotes sendo rasgados, as garotas voltaram aos seus quartos para pegar seus presentes, ficamos ali por horas conversando, rindo e comendo os doces ganhos. Alex, veio nos chamar para tomarmos um café muito caprichado, e depois fomos para o quintal, aproveitar que a neve estava alta, e fizemos vários bonecos de neve, e também fizemos uma guerra de neve, muito divertida.
Brianna com as bochechas vermelhas por causa do frio e da agitação, se aproximou e perguntou empurrando uma bola de neve na minha mão:
- Viu como Papai Noel existe?
- Sim, agora eu sei que ele existe.
Aquele foi o Natal mais feliz da minha vida e eu não queria que acabasse.

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