Wednesday, February 28, 2007

Novidades Inesperadas - Parte II

Rio de Janeiro, 16 de Novembro de 1981

- Cott, aqui!

Scott havia acabado de desembarcar e olhava ao redor a minha procura. Ao ouvir minha voz e me localizar ele largou a mala maior no chão abrindo os braços e eu corri até ele, me pendurando em seu pescoço.

- Como eu senti sua falta, Cott – falei abraçando ele forte
- Também senti muito sua falta – ele beijou minha testa e segurou meu rosto de modo que eu olhasse para ele – Não fez nenhuma bobagem, não é?

Sacudi a cabeça negativamente e ele sorriu, olhando para minha barriga. Ele pegou as malas do chão e caminhamos até o carro sem dizer nada, apenas andando abraçados.

Parei o carro com ele em um café para comermos alguma coisa e conversarmos. Começamos falando de como as coisas estavam desde que me mudei, ele me contou o que andava fazendo e sobre a reunião com as meninas no dia anterior, mas o assunto era inevitável e acabou vindo à tona. E para minha surpresa, partiu de mim a iniciativa de falar sobre isso.

- Essa era a ultima coisa que eu imaginava que fosse acontecer...
- Eu sei – ele segurou minha mão a apertando – mas aconteceu, e você vai ter que encarar isso sem medo
- Sem medo é impossível, Cott. Nunca senti tanto medo na minha vida, e por algo que nem ao menos quero manter
- Desculpa Lou, mas não vou deixar você tirar essa criança – ele me encarava muito sério e parecia decidido a não dar para trás
- Acho que quem deve tomar essa decisão sou eu, não você.
- Claro, mas eu conheço você, Louise. Conheço você o suficiente para saber que não é isso que você realmente quer
- Você não pode saber o que quero, por mais que me conheça, porque não faz idéia de como estou me sentindo – meus olhos começavam a se encher de lagrimas outra vez e me segurei para não deixá-las cair
- Tem razão, não sei como você está se sentindo. Mas sei que essa é a decisão errada, Lou. Por favor, me escuta! Essa criança não tem culpa de nada que aconteceu, não é culpa dela ter que crescer sem o pai. Mas ela vai ter a mãe, vai ter a mim, a Nanda, as meninas, todos nós estamos do seu lado. Você não quer fazer isso, porque você não quer esquecer o Remo. E essa criança vai fazer você lembrar sempre tudo que vocês viveram.

Escondi o rosto com as duas mãos e me apoiei na mesa, segurando a lágrima que teimava em cair. Scott segurou com força os meus pulsos e me forçou a olhar para ele mais uma vez. Mas ele agora não estava tão sério e sorria de leve. Não pude deixar de evitar que um sorriso se formasse em meu rosto, ainda que fraco.

- Acho que mais uma vez você tem razão...
- Então vem comigo, vamos ao médico
- O que? Agora? – olhei para ele assustada
- Sim, agora. Pedi pra Nanda marcar uma consulta pra você, agora vamos até lá
- Tudo bem. Acho que não tem motivo para adiar mesmo...
- Não, não tem. Eu vou com você. Você não vai ter que fazer nada sozinha.

ººº

- Isso é esquisito...
- O que? – Scott olhava tudo ao redor dele distraído – Aquele bebê naquela foto ali? Ele realmente é esquisito...
- Scott! – exclamei rindo – É só um bebê, não fala assim! Mas não é isso... É que geralmente eu estou fazendo esses exames, e não deitava aqui. Isso é extremamente confortável, me sinto até mal em pensar assim... E não faça nenhum comentário! – disse vendo a cara dele
- Não ia falar nada – e prendeu o riso, se contradizendo
- Bom dia – uma médica de cabelos ruivos muito claros e curtinhos entrou na sala e paramos de rir – Eu sou a Dra. Patrícia. Vamos ver como anda essa gestação?

Sorri sem jeito para ela e procurei pela mão de Scott na cama, espremendo-a ao encontrar. Ele se aproximou mais de mim e puxou uma cadeira para sentar ao meu lado enquanto a médica passava o ultra-som pela minha barriga. Só conseguia ver imagens difusas, mas por estar acostumada com o procedimento logo encontrei o que procurava. E não pude contar o sorriso.

- Parabéns, você já esta com quase dois meses de gestação
- Dois meses já? – Scott falou de repente, sem tirar os olhos da tela – Como demorou tanto a perceber?
- Tinha outras preocupações em mente...
- Isso é normal, muitas não percebem até o 2º mês. Acreditem, algumas não percebem nem no 5º mês! Você é o pai, certo?
- Ah, não, não, eu... – Scott ficou sem graça e começou a gaguejar
- Ele não é o pai, é o padrinho...
- Entendi. Vou deixá-los a sós um pouco, volto daqui a alguns minutos.

A Dra. Patrícia saiu da sala e olhei para Scott. Ele agora tinha tirado os olhos da tela e me encarava com uma expressão que misturava surpresa e alegria. Sorri de volta para ele e ficamos sem conversar até a médica voltar para a sala, apenas encarando a tela com aquele ponto minúsculo. Um ponto minúsculo que mudaria minha vida inteira. Algo capaz de me fazer sentir medo e felicidade ao mesmo tempo. Meu filho...

Saturday, February 24, 2007

Novidades Inesperadas - Parte I

Rio de Janeiro, 14 de Novembro de 1981

- Não, claro que eu vou! Acabei de chegar em casa e vou ligar pra minha prima, ela ainda está no hospital, mas ela vai comigo sim e... – a voz da Nanda morreu quando ela entrou na sala – Arthur, eu ligo pra você depois. Lou? O que está fazendo em casa?

Nanda acendeu a luz e caminhou até o sofá onde eu estava sentada, encarando fixamente a janela. Ela parou na minha frente e tirou a caixa que eu segurava nas mãos, já quase a amassando.

- Lou... – ela olhou a caixa e me encarou de volta – Você está...?
- Não sei, não tive coragem de abrir ainda – falei finalmente, os olhos cheios de lágrima
- É dele, não é? – Nanda falava com tanta pena na voz que estava me fazendo querer morrer. Não precisei falar para ela saber qual era a resposta – Sinto muito...

Tapei o rosto com as mãos e me afundei ainda mais no sofá, começando a chorar. Nanda me devolveu o teste de gravidez que segurava e me puxou do sofá.

- Bom, você não pode ficar na incerteza esperando a barriga crescer para confirmar. Levanta daí e faz logo esse teste
- Tenho medo do que ele vai me dizer, quero muito estar errada
- Mas se não estiver, não há nada que possa fazer. Não adianta adiar, é pior...

Concordei com ela e levantei do sofá, indo até o banheiro e secando as lágrimas. Isso não podia estar acontecendo comigo...

ººº

Londres, 15 de Novembro de 1981

- Ele então me ligou, dizendo que estava preso dentro do carro e um monte de garotas de 13 anos enlouquecidas socavam o vidro querendo arrancar ele de lá!
- E o que ele fez??
- Não sei, eu estava ocupado e não podia ajudar muito. Sugeri aparatar, mas ele achou que seria falta de educação. Só pude rir da situação e deixar que ele se virasse...
- Como você é ruim, Cott! Coitado do Ben...
- Olha quem está falando, Samantha Cohen! Você também está rindo!
- Estão falando mal de quem, hein? Se bem conheço meus amigos, para rirem desse jeito, é porque estão soltando o veneno!
- Está atrasada, Alexandra... Sam e eu já estamos no 3º copo de café!
- Não amole, Cott. Experimente trabalhar no Ministério e vai ver que é impossível sair no horário...
- Não obrigado, já tive uma péssima experiência lá e não pretendo repetir

Meu espelho de duas vias começou a apitar de repente e Alex sentou, rindo junto com Sam da minha dificuldade para encontrá-lo. Quando finalmente achei, vi que era Louise.

- É a Lou! – falei animado
- Ah eu quero falar com ela! – Sam logo esticou a mão para me tomar o espelho
- Eu também quero! Diz que estamos todos com saudades! – Alex sorria animada
- Oi Lou! – atendi a chamada feliz por estar falando com ela – Como você está? Alex e Sam estão aqui na minha frente mandando beijos, antes que esqueça
- Manda um beijo pra elas também, estou com saudades de vocês – ela respondeu com um tom de voz um pouco forçado
- Está tudo bem, Lou? Sua voz está estranha...

As meninas pararam de se sacudir nas cadeiras e me encararam sérias, vendo que eu não ria mais. Lou também se calou e logo percebi que ela estava chorando. Entrei em desespero, sem saber o que estava acontecendo.

- Lou, o que houve? Por que você está chorando?
- Ah Cott, eu... – ela começou a soluçar no espelho – eu estou grávida. E não quero essa criança...

Por um instante ficamos todos calados, sem saber o que falar ou até mesmo como reagir. Normalmente deveríamos reagir a isso com alegria, mas não quando ela nos conta isso aos prantos e o pai da criança está morto. E principalmente quando ela diz que não quer ter o bebê. Foi Alex que quebrou o silencio e tirou o espelho da minha mão.

- Lou, me escuta, por favor. Sei que você está triste e tem todos os motivos do mundo pra isso, mas não faça nada que vá se arrepender depois.
- Alex eu não posso fazer isso, não vou conseguir sozinha – Louise chorava cada vez mais
- Pode sim, claro que pode. Lembra quando eu perdi o bebê, como fiquei? E não foi nada planejado, eu não queria perder ele, sequer sabia que estava grávida! Como você acha que vai se sentir se interromper isso por vontade própria?
- Eu vou olhar pra ele e lembrar do Remo... Não quero, já está muito difícil sem isso, não acho que consiga suportar. Não posso fazer isso sozinha.
- Você não está sozinha, nós estamos aqui para ajudar no que precisar – peguei o espelho de volta e a encarava sério
- Não é a mesma coisa, vocês estão muito longe. E não vou voltar a Londres, não posso
- Então eu vou até você. Já falamos sobre isso mais de uma vez e agora não vou mais dar ouvidos a você. Não vou deixar você sozinha agora.
- Você vem mesmo? – ela continuava chorando, mas parecia mais controlada – Ah Cott, você tem sua vida aí, está começando a se organizar e ...
- Não Lou, chega, já falei que vou. Não tenho nada que me prenda aqui e posso voltar sempre que quiser para ver as meninas. Só quero que você me prometa que não vai fazer nenhuma besteira até eu chegar. Pode prometer isso?
- Não vou fazer nada...
- Então amanha dê um jeito de me buscar no aeroporto, estou indo hoje a noite
- Lou, nós não podemos ir, mas vamos dar um jeito de ver você muito em breve! – Sam falou puxando o espelho e Lou sorriu pela primeira vez
- Pensa que esse foi o jeito encontrado pra manter ele vivo... – Alex apareceu no espelho também sorrindo – E com o Cott ai você não vai se sentir tão sozinha.
- Obrigada meninas... Preciso ir agora, já estou atrasada para o trabalho. Amo vocês, estou com saudades.
- Mais tarde chamo você outra vez, antes de ir embora – e ela desligou
- Ai gente, desculpa o atraso! Vocês não imaginam o inferno que foi para conseguir passar por toda aquela fiscalização com as chaves de portal! – Yulli acabara de chegar e mudou a expressão ao nos ver – Merlin, que caras! O que aconteceu??

Nós três nos encaramos mudos, ainda sem muita reação, e contamos a ela o que havia acontecido antes de sairmos os quatro do pub para o meu apartamento. Tinha apenas algumas horas para arrumar tudo que queria levar e encontrar uma passagem...

Continua...

Thursday, February 22, 2007

Quase sambistas – Parte I

Por Louise Storm

- Ai Alex, sai logo, ta calor aqui dentro!
- Mas eu já saí e você também!
- E por que ainda está abafado??
- Merlin... Acho que vou me mudar pra cá! Olha a vista!

Estava parada na sala da minha casa ao lado de Remo, Scott e Ben, rindo dos nossos amigos. Alex, Yulli, Sergei e Kyle haviam acabado de sair pela nossa lareira e já sentiam o calor do Rio de Janeiro invadi-los. Acho que essa semana aqui vai ser bem engraçada...

*************************

- Pra onde estamos indo? – Alex falou correndo para nos acompanhar
- Ora, vocês não queriam desfilar? Temos que buscar as fantasias! O desfile é daqui a 5 horas.
- Então está cedo demais, não? – Kyle nos alcançou – Ainda dá tempo de tomar outro daquele drink de limão.
- Infelizmente não, 5 horas passam voando. Depressa, vamos!

Já haviam se passado dois dias desde que eles chegaram e hoje, depois de somente assistir aos desfiles, participaríamos dele. Scott tinha conseguido fantasia para todos na União da Ilha e o amigo dele estava a nossa espera para nos entregá-las e assim podermos atravessar os cercados que levavam à concentração da escola. Alex e Yulli vinham ao meu lado e íamos fofocando no caminho, atualizando uma a outra das ultimas novidades. Elas estavam achando o maior abuso o fato de que Scott e Ben não estivessem usando nada além de uma bermuda e chinelo no meio da rua, exibindo o físico para elas quando elas sabiam que 1º: estavam acompanhadas dos maridos e não poderiam fazer absolutamente nada e 2º: eles eram gays.

- Isso devia ser proibido – Yulli resmungou olhando para Scott
- Ai não posso olhar – Alex se forçava a olhar para as diversas pessoas passando com fantasias imensas nas mãos – é até pecado saber que nada pode ser feito.
- E você acha que eu não sei disso? – respondi rindo e quase chorando ao mesmo tempo – moro com ele desde que nos mudamos pro Brasil!
- Como é que é? As madames vão ficar fofocando ou vão andar mais rápido? – Scott diminuiu o passo e parou ao nosso lado, abraçando as meninas
- Sai Scott, sai de perto! – Yulli deslizou ate sair do abraço dele e começamos a rir
- O que eu fiz? – ele perguntou sem entender nada
- Você nasceu lindo, só isso – respondi rindo e ele caiu na gargalhada
- OK, eu prometo que na próxima encarnação venho com a mesma aparência e não viro gay. Ta bom assim? Podemos acelerar o passo? Ta começando a tumultuar a rua e ainda não chegamos!
- Nós vamos cobrar essa promessa, viu?? – falamos em coro e ele riu

Andamos acompanhando o ritmo dele, sem desviar o olhar dos três que andavam logo na nossa frente. Era muita mulher passando quase sem roupa alguma para perder eles de vista por um segundo sequer. Logo chegamos na concentração da Ilha e pegamos as fantasias. De graça nem se pode reclamar: a fantasia era cheia de penas! Ficamos por lá mesmo tentando descobrir como vestia aquilo, qual era a ordem, quando fomos notificados que a escola que desfilava naquele momento estava com alguns carros quebrados e ia atrasar todas as outras. Como todos estavam com sede por conta do calor decidimos sair da concentração e parar em alguma barraca para tomar alguma coisa, as fantasias a tiracolo.

- Ah, isso sim mata a sede! – Sergei falava sorridente segurando um copo de caipirinha
- Quanto tempo até o desfile?
- Mais algumas horas com esse atraso, mas passa rápido, não se preocupem.
- Não estamos preocupados! – Yulli falou também bebendo – eu ao menos estou adorando!
- Ser lobisomem te deu o direito de vir morar no céu é? – Kyle virou para Remo, desviando o olhar das mulheres que passavam na rua
- Agora entendo porque a Alex não deixa o Ty vir aqui nesta época, pode ferir as vistas dele – Sergei completou o comentário

Na mesma hora nós três olhamos atravessado para eles: Alex e Yulli irritadas com os comentários de Kyle e Sergei e eu encarando Remo esperando para ver o que ele ia responder. Quando perceberam as caras enfezadas eles logo mudaram de assunto, mas ainda com aqueles sorrisos bestas na cara. Mas tudo que vai, volta. No mesmo instante passaram alguns rapazes novos, no mesmo tipo físico de Scott e Ben, e nos secaram da cabeça aos pés. O sorriso vitorioso mudou de lado e os três assumiram um bico do tamanho de uma melancia, desafiando os rapazes com o olhar. Scott, que estava do outro lado da rua perto deles, se aproximou rindo.

- Que foi, Scott? – perguntei logo
- Os rapazes que estavam quase engolindo vocês com o olhar saíram decepcionados
- Ah é? Por que? – Remo perguntou mais animado
- Porque disseram que não ia rolar nada, as moças estavam acompanhadas de três coroas – e nós quatro caímos na gargalhada
- Viu? Estamos melhores na fita que vocês três – Alex falou triunfante – melhor começarem a entrar em forma, coroas.
- Podiam começar pintando o cabelo, já da uma renovada! – falei debochada enquanto eles aumentavam o bico
- Ok, chega de judiar deles, porque eles são a realidade de vocês – Ben falou rindo e os três só faltaram aplaudir em concordância.
- Ah Ben seu puxa-saco! Só porque você é auror também! – Yulli reclamou em tom de brincadeira

Estávamos ainda um implicando com o outro de brincadeira quando do nada, começou a chover. Aquelas chuvas de verão que surgem de repente, numa pancada rápida e violenta. Fomos pegos totalmente desprevenidos com a rapidez com que a chuva tomou força e a única coisa mais lógica de se fazer foi correr para um abrigo. E qual não foi à surpresa ao ver que todos já estavam lotados? Ben gritou para seguirmos ele e fomos todos para a parte de trás dos prédios, onde tinham lugares vazios ainda. Largamos as fantasias no chão e sentamos ao lado delas, cansados e ensopados.

- Gente... – Sergei falou colocando a fantasia perto do nariz – acho que a minha fantasia ta fedendo a pato molhado!

Diante desse comentário do Sergei, não paramos mais de rir. Já estávamos encharcados dos pés à cabeça e não podíamos nem olhar um pra cara do outro pra cair na gargalhada. Ficamos por ali um bom tempo, esperando a chuva passar e vendo as pessoas que saiam dos desfiles passando arrastando as fantasias, uns já exaustos e outros ainda animados, cantando o samba da sua escola. Quando um dos componentes da Ilha passou avisando que já estavam começando a organizar a concentração, levantamos e o seguimos. A fase pré-desfile acabou. Agora era a preparação pra hora do vamos ver!