Sunday, January 04, 2009

Suécia, 19 de Julho de 1979

Havia passado à noite em claro desde que voltei do hospital. Toda a conversa que tive durante o dia inteiro com minha mãe ficava martelando na minha cabeça e cansado de me revirar na cama, levantei no meio da madrugada e me tranquei no escritório do meu pai. Sentei em sua poltrona e fiquei encarando o jardim pela janela até amanhecer.

Louise ia para casa na parte da tarde, mas antes havia saído com Megan e fiquei em casa sozinho com Wayne, que veio passar as férias em casa por causa da nossa mãe. Não queria sair do escritório e depois do café, Wayne se juntou a mim. Passamos à manhã toda de pijamas, jogando xadrez de bruxo sem conversar. Ninguém queria falar, tentávamos evitar ao máximo tocar no assunto que também mantivera meu irmão acordado por boa parte da noite.

- Acho que ouvi alguém aparatar – Wayne quebrou o silencio e parei para ouvir também

Ouvimos passos apressados na escada e segundos depois a porta do escritório abriu. Nosso pai entrou com uma aparência abatida, nunca havia visto o velho daquele jeito, e aquilo me apavorou. Levantei da cadeira esbarrando no tabuleiro e espalhando as peças e Wayne me olhou alarmado. Antes mesmo que ele falasse alguma coisa, já sabíamos.

- Meninos, vamos até a sala, por favor – papai falou cansado.
- Não – falei sacudindo a cabeça – Não! Não se atreva a falar que... – e minha voz morreu.
- Por favor, Scott, não torne as coisas mais difíceis – papai caminhou até a gente e Wayne o abraçou.
- Não! – papai tentou me abraçar também, mas o empurrei e corri para fora do escritório.

Passei por Megan no corredor, que chorava no ombro de Louise, e entrei no quarto batendo a porta. Apoiei as mãos na janela e encarei a piscina no jardim com a respiração ofegante. Ouvi a porta abrir e em seguida as mãos de Louise apertaram meu ombro. Olhei para ela com um olhar perdido e assustado e ela me puxou para perto dela. Abracei-a com força e comecei a chorar, desesperado. Minha mãe havia morrido e eu não sabia o que fazer.

***

No mesmo dia que recebemos a noticia da morte da mamãe, Louise se encarregou de avisar a todos os nossos amigos e no dia seguinte de manhã todos estavam na Suécia para acompanhar o enterro. Não me conformava e nem conseguia parar de chorar um minuto sequer, mas a parte mais dolorosa foi quando fecharam o caixão para descê-lo na terra. Foi quando me dei conta de que aquela era a última vez que estaria perto da minha mãe, a última vez que veria seu rosto que não fosse através de uma fotografia. E aquela última imagem da minha mãe me perturbava. Sabia que por mais que me esforçasse, sempre que pensasse nela, veria sua imagem dentro do caixão antes de imaginá-la saudável.

Depois do que pareceu uma eternidade, o caixão foi coberto com terra e o enterro finalmente chegou ao fim. Papai ainda recebia as condolências de algumas pessoas, a maioria funcionários do Ministério, e sentei em um banco mais afastado com meus amigos. Eles conversavam comigo e tentavam me animar, mas me limitava apenas a ouvir e balançar a cabeça. Alheio a conversa deles, vi quando dois funcionários da campanha de reeleição do meu pai se afastaram da multidão. Eles vinham conversando e não mantinham a voz baixa.

- Horrível isso tudo – um deles comentou olhando na direção do meu pai
- É, uma morte nunca é fácil – o outro respondeu olhando ao redor – Mas se quer minha opinião sincera, foi o melhor para o Stuart.
- Como é? – o outro se espantou e me mexi desconfortável no banco, a mão apertando a varinha no bolso – Me explique como perder a esposa pode ser o melhor para o Stuart.
- Ora Denis, vamos ser francos! Stuart quer ser reeleito como Ministro da Magia e estar casado com uma sangue-ruim não estava fazendo nada bem a sua campanha! E agora que ela morreu, ele vai ter o apoio dos que ficaram com pena e das famílias puro-sangue também!
- Não fala assim da minha mãe! – levantei do banco já com a varinha em punho e vermelho de raiva – Estupefaça!

Gritei fora de controle e o homem que chamou minha mãe d sangue-ruim voou longe. O outro homem chamado Denis se assustou e puxou a varinha, olhando para o outro caído.

- Expelliarmos! – o desarmei antes que ele pensasse em um feitiço
- Calma, garoto! – ele ergueu os braços, recuando – Não faça nenhuma bobagem!
- Scott! – meus amigos vieram correndo até mim
- Incarce- - o homem que derrubei já estava de pé e apontava a varinha pra mim
- Protego! – gritei depressa – Impedimenta! – o homem caiu para trás outra vez e corri até ele – Minha mãe não era uma sangue-ruim! – gritei na cara dele, chutando a varinha em sua mão
- Scott, chega! – senti quatro mãos me agarrarem e vi que Ben e Lu me puxavam para longe dele
- Me soltem! – me debati, mas em vão. Os dois eram mais fortes.
- Não vamos soltar até você se acalmar! – Lu falou ríspido e me arrastaram de volta pro banco
- O que está acontecendo? – papai veio correndo com Wayne, Megan, Karen e Kegan
- ELE CHAMOU A MAMÃE DE SANGUE-RUIM E DISSE QUE FOI MELHOR ELA TER MORRIDO! – cuspi as palavras aos berros e Wayne fechou o punho, olhando para o homem. Kegan segurou seu braço quando ele fez menção de ir até lá.
- Scott, vá para casa com seus irmãos! – papai ordenou olhando para os homens caídos no chão, nos encarando.
- Você não vai fazer nada? – perguntei incrédulo
- Vão para casa, eu cuido disso! – ele disse ríspido, lançando um olhar de raiva para os dois – Wayne, leve eles embora, agora!

Wayne ainda hesitou, mas papai o olhou severo e ele assentiu com a cabeça, guiando todos nós para fora do cemitério. Karen e Kegan foram os únicos que ficaram com ele e voltamos todos para a nossa casa, Lu e Ben ainda me segurando com medo de que eu voltasse a atacar os dois homens. Esperamos por horas espalhados pela sala, até que os três voltaram.

- Pessoal, vou levar vocês de volta para casa – Kegan puxou três objetos pequenos do bolso e entregou um ao Remo – Alex e Yulli, tem uma chave de portal para cada uma de vocês, para que voltem à Escócia e Japão. Os demais voltam para Londres pela caixa de fósforos que está com Remo – e entregou uma lata amassada e um lápis para as duas – Karen, depois eu volto, ok? – e minha irmã assentiu com a cabeça
- A gente volta ainda essa semana, ok? – Louise me abraçou e as meninas confirmaram o que ela disse, me abraçando também.

Cinco minutos depois todos já haviam desaparecido e papai sentou no sofá, me encarando. Wayne e Megan olhavam para ele curiosos.

- Pai, desculpa – falei depressa – Não queria fazer isso, mas se você visse como ele falava da mamãe...
- Você não tem que se desculpar, Scott – papai ergueu a mão, calmo – Quem tem que fazer isso é Elliot, e acredite, ele o fará.
- O que vai acontecer a eles, pai? – Wayne perguntou
- Foram demitidos – papai respondeu seco – Mas infelizmente as coisas não terminam ai.
- Por quê? – agora era Megan que falava – O que mais aconteceu?
- Por mais que tenha apenas defendido sua mãe, você atacou dois membros do ministério na frente de dezenas de trouxas – papai falou me encarando sério – O Conselho dos Bruxos já se manifestou quanto a isso e somado ao fato de que você utilizou uma maldição imperdoável por duas vezes, você terá que ir a julgamento e está fora do meu alcance impedir isso.
- Eu vou para Azkaban?? – perguntei assustado
- Não, se acalme, Azkaban está fora de cogitação – papai me tranqüilizou – Mas haverá algum tipo de punição e temos que estar preparados para isso.
- Não se preocupe, Scott – Karen falou apertando minha mão – Papai vai estar lá o tempo todo e o pai do Kegan faz parte do Conselho, vai ajudar.
- Vai dar tudo certo, filho.

Papai levantou do sofá e me puxou para um abraço, apertando meus cabelos. Sequer conseguia me lembrar a última vez que o abracei, mas aquele gesto me tranqüilizou um pouco. Claro que estava com medo do julgamento, mas meu pai estava do meu lado e sabia que independente da minha punição, tudo ia terminar bem.

Someday I'll wish upon a star
Wake up where the clouds are far behind me
Where trouble melts like lemon drops
High above the chimney tops that’s where you'll find me

Somewhere Over the Rainbow

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